quinta-feira, 8 de abril de 2010

Químico desenvolve material utilizado em eletrodos de células a combustível


ISABEL GARDENAL

Criar um novo material sólido para ser utilizado em eletrodos de células a combustível foi uma das proposições da pesquisa do doutorando Jean Marcel Ribeiro Gallo, defendida recentemente no Instituto de Química (IQ). Trata-se de um condutor de eletricidade baseado na estrutura de uma “peneira molecular”, que por sua vez é um importante material de suporte com uma grande área superficial a qual garante maior espaço para ocorrerem reações de interesse da pesquisa. Além do valor do invento, que busca a substituição das fontes de energia tradicionais por uma alternativa e sustentável, o trabalho revela-se a primeira experiência do Instituto num programa de doutorado de co-tutela. A parceria, neste caso com a Università del Piemonte Orientale, Itália, possibilitará a Gallo receber dois diplomas com o título de doutor em ciências. Na Itália, o certificado será expedido em poucas semanas.

Gallo relata que aproveitou ao máximo a permanência na Itália e que sua escolha recaiu sobre este país por uma conjunção de fatores, sendo talvez o mais forte o fato de ter ascendência italiana. Ele chegou em Alessandria, cidade que abriga aquela universidade, com algumas incertezas em relação à língua, pois havia feito apenas um curso básico no Brasil. Mas estava convicto quanto à escolha do tema que iria desenvolver, o que facilitou optar por uma pesquisa de envergadura, tendo como foco as células a combustível. Ganhou dois orientadores: a professora Heloise de Oliveira Pastore, atual diretora do IQ, e o professor italiano Leonardo Marchese, do Departamento de Ciência e Tecnologia Avançada da Università del Piemonte Orientale.

No estudo de Gallo, o novo material é descrito como um sólido cerâmico poroso. Ele possui poros de tamanhos muito precisos, capazes de selecionar moléculas, característica que herdou das peneiras moleculares. Mas também contém partículas condutoras de grafite que permitem o seu emprego como eletrodos na célula a combustível. Sobre esse material são depositados os metais que são os catalisadores, já devidamente descritos na literatura. “O fato de se usar especificamente estes catalisadores não foi descoberto por nós. O que é de nossa autoria é o material com o qual se fazem os eletrodos. Ele exibiu um desempenho maior (20% a 40%) do que o material comercial”, ressalta Pastore.

As células a combustível, informa o pesquisador, correspondem a baterias que, ao invés de serem carregadas na corrente elétrica, como aquelas dos celulares e dos notebooks, passam a ser alimentadas com combustível. Em sua pesquisa, o combustível adotado foi o metanol, cuja uso foi detalhado ao longo dos quatro anos de doutorado, “entretanto o etanol será o objetivo futuro do nosso trabalho”, esclarece. O etanol, o mesmo álcool presente nas bebidas alcoólicas e nos combustíveis dos postos de gasolina, se distingue do metanol por duas razões principais: é menos tóxico, apresentando menor risco de contaminação; e é produzido abundantemente no Brasil a partir da cana-de-açúcar.

Pastore aponta que a reação da célula produz gás carbônico (CO2). Por esse motivo, salienta que algumas pessoas têm questionado a sustentabilidade de tal sistema, já que emite um gás estufa, mas também ressalta que neste caso é um bioálcool. “Portanto, de uma certa forma é tão sustentável e renovável quanto o etanol usado nos veículos.”

Gallo chegou à avaliação da nova família de materiais cerâmicos, denominada por ele e seus orientadores “carbonos cerâmicos mesoporosos”, com medidas eletroquímicas baseadas na variação da voltagem, em função do quanto a célula deve produzir de corrente elétrica. A tecnologia das células a combustível não é recente, adianta. O primeiro boom sobre o assunto ocorreu na década de 70.

Existe inclusive o uso dessas células comercialmente, expõe o químico. “Não tanto deste tipo que trabalhamos. Embora já haja sistemas comerciais que estão sendo vendidos e instalados. Um muito difundido é o gerador de eletricidade de emergência da Universidade da Califórnia, relata o pesquisador. “Por outro lado, ainda será preciso avançar para substituir completamente os sistemas em uso atualmente.”

As intervenções na tese, segundo Gallo, partiam de ambos os orientadores e não raro discutiam a três o passo a passo do trabalho. Ele enviava alguns rascunhos efetuados na Itália para Pastore fazer suas próprias anotações, e vice-versa. Apesar de mais trabalhosa, a pesquisa valeu a pena na sua opinião e resultou em um “material duplamente qualificado”.

O químico garante que é inédita na Unicamp a investigação de células a combustível baseadas em etanol ou metanol. “Temos no Instituto de Física um grupo de pesquisa dedicado a estas células, porém alimentadas diretamente com hidrogênio. O nosso estudo envolve uma célula a combustível baseada em metanol como modelo para uso na direção do etanol.”

O custo final de uma célula a combustível desse tipo ainda não foi estimado, pois a produção ocorreu apenas em escala laboratorial. Os testes iniciais, feitos com metanol, indicam que a célula construída com o novo sólido para os eletrodos tem um melhor desempenho, particularmente em um dos eletrodos da célula a combustível. O uso no outro eletrodo precisará passar por um processo de otimização. “Após isso ainda será necessário determinar como fazer a célula funcionar com o etanol, o que é tecnicamente mais difícil, para então começar a pensar em comercialização. Uma coisa é certa: estudaremos o uso do etanol”, afirma.

fonte:http://www.unicamp.br/unicamp/unicamp_hoje/ju/abril2010/ju456_pag11.php#

Metodologias detectam metais no etanol


Controle de qualidade do produto
pode ser realizado em até meia hora



JEFERSON BARBIERI


Pesquisa de doutorado desenvolvida no Instituto de Química (IQ) da Unicamp, com o apoio da Fapesp, chegou a três novas metodologias para o controle de qualidade do etanol combustível, utilizando a técnica de cromatografia de íons. Uma delas foi feita para a determinação de compostos aniônicos e as outras duas para íons metálicos, que incluem metais pesados e de transição. O trabalho feito por Jailson Cardoso Dias envolveu diferentes procedimentos de otimização, tanto da parte de separação cromatográfica quanto do tratamento dos dados. Num curto espaço de tempo, entre 20 e 30 minutos, há a possibilidade de determinação sequencial de até nove metais, incluindo a especiação do ferro, que foi considerada pela primeira vez em bioetanol. Outro objetivo desse trabalho é estimular o estabelecimento de novas normas para o controle de qualidade, não apenas no sentido de inserir novos analitos na legislação como também para desenvolver metodologias alternativas
simples e de baixo custo.

De acordo com Dias, a legislação vigente, que estabelece as normas do etanol combustível no país (resolução ANP nº 36, de 2005) relacionadas aos parâmetros de qualidade, contempla poucos contaminantes químicos. Portanto, ele acredita que o desenvolvimento dessas novas metodologias seja um avanço, especialmente para a determinação de substâncias potencialmente contaminantes que não constam da resolução atual.

No caso do ferro e do cobre, explicou o pesquisador, já existem especificações, porém por metodologia espectroscópica. Os métodos cromatográficos desenvolvidos por ele são alternativos, apresentando alta seletividade e níveis de detectabilidade semelhantes àqueles obtidos pelas técnicas espectroscópicas, da ordem de partes por bilhão (ppb), com a vantagem de injeção direta de amostra sem precisar de pré-tratamento. Outra informação que o pesquisador considera bastante relevante é o emprego de um novo reagente químico em cromatografia, o qual possibilitou a estabilização do ferro(II) no meio.

O processo de contaminação, não só do etanol como de combustíveis em geral, pode acontecer desde a produção até a estocagem do produto para o consumidor final. São várias etapas, daí a importância do controle de qualidade, sobretudo porque o Brasil atualmente não é apenas um produtor, mas também um grande exportador de etanol. “Esse controle, principalmente para a exportação, deve ser mais rigoroso com essa matriz energética”, afirmou Dias.

Parceria

O desenvolvimento do trabalho foi feito em colaboração com o Centro Australiano de Pesquisa em Ciência da Separação (Australian Centre for Research on Separation Science – Across), sediado na Escola de Química da Universidade da Tasmânia (Austrália).
Trata-se de um dos mais importantes na área de ciência de separação em geral, não só de cromatografia de íons, como de cromatografia gasosa e eletroforese capilar. Em 2009, Dias realizou um estágio de cinco meses recallnessa instituição, sob a supervisão dos professores Pavel Nesterenko e Paul Haddad, autoridades da área.

Para o orientador do trabalho, professor Lauro Tatsuo Kubota, essa é a primeira colaboração entre o Laboratório de Eletroquímica, Eletroanalítica e Desenvolvimento de Sensores (Leeds) do IQ e o centro australiano, reconhecido mundialmente como o melhor em cromatografia de íons. Sobre a importância da pesquisa, o orientador enfatizou que o trabalho tenta suprir as necessidades do dia-a-dia. A questão do bioetanol, segundo Kubota, é importante não só para detectar uma fraude ou a qualidade, mas também para a obtenção de mais detalhes sobre o produto. “Existem várias questões que ainda não estão bem estabelecidas”, afirmou.

Uma delas se refere à quantidade de zinco encontrada nas amostras de etanol combustível, e que não é um parâmetro estabelecido pela legislação, tanto nacional quanto internacional. O que será necessário agora é determinar de onde vem essa fonte de zinco e o que isso pode causar. “Não sabemos os efeitos da presença deste metal no etanol combustível nos motores automotivos”, observou Kubota. O docente ressalta que esse tipo de informação é importante para melhorar o biocombustível, não só em termos de qualidade como também no que diz respeito à produção, transporte e estocagem. E, segundo o pesquisador, todo o conhecimento do produto em si leva ao aprimoramento de toda a cadeia, desde a produção até o consumo. “Se ficarmos restritos às análises das legislações, perderemos o restante da informação”.

Com relação aos equipamentos utilizados na pesquisa, Kubota garante que são os mesmos que Dias utilizou na Austrália. A metodologia estabelecida é que é o diferencial. A estratégia é diferente. “Trata-se de uma linha de pesquisa ainda incipiente no Brasil, com muita coisa a ser feita”.

Segundo Dias, existem outros métodos cromatográficos descritos na literatura para a determinação de elementos metálicos, no entanto ele usou uma coluna cromatográfica especial. Atualmente, a melhor coluna cromatográfica comercial não permite utilizar etanol com injeção direta de amostra, porque ela é feita à base de látex, um substrato polimérico não resistente a essa matriz orgânica. A coluna utilizada por Dias é à base de sílica, que se mostrou bastante estável – mesmo com 100% de etanol, não apresentou problemas. Todos os métodos foram desenvolvidos para matriz etanólica. Essa é uma vantagem porque, em geral, os procedimentos existentes necessitam de um tratamento prévio da amostra, o que demanda muito tempo. “Nossos métodos são rápidos e simples. A corrida é feita e os resultados são sequenciais. É um dos melhores sistemas cromatográficos para íons metálicos que já foi desenvolvido até o momento”, ressaltou Dias.


fonte:http://www.unicamp.br/unicamp/unicamp_hoje/ju/abril2010/ju456_pag09.php